Comportamento. Eles não curtem mais o Facebook
Há sinais de fadiga entre os usuários da maior rede social do planeta. Alguns até já escolheram alternativas: Instagram, WhatsApp e Tumblr
Rafael Sbarai
Nathalia Petreche, 18 anos: deixou o Facebook para investir seu tempo no Instagram e WhatsApp (Anna Carolina Negri)
O Facebook surpreendeu o mundo recentemente ao reconhecer que os adolescentes andam um tanto cansados de dedicar horas e horas à rede de 1 bilhão de amigos. À novidade, deve-se somar outra informação: a fatiga não é exclusividade desse público. Medições independentes mostram um ligeiro afastamento também entre a rede e adultos, que tanto eliminam seus perfis quanto reduzem as visitas ao site. Segundo o site SocialBakers, que acompanha o tráfego na rede social, os Estados Unidos acumulam perda de 2,9 milhões de usuários nos últimos três meses, emagrecimento de 1,8% no total de 163 milhões de cadastrados no país. O mesmo fenômeno já foi registrado na Grã-Bretanha, França, Alemanha e Canadá, os chamados mercados "maduros", onde a rede pode ter atingido seu público máximo. Será que a paixão pela rede arrefeceu?
No caso dos jovens, a hipótese mais provável, levantada pelo próprio Facebook, é de migração. Munidos de smartphones e tablets, esse público visceralmente ligado à ferramentas virtuais estaria explorando outras fronteiras, recorrendo inclusive a produtos que originalmente não foram concebidos como rede social. É o caso do serviço de imagens Instagram e do Tumblr, híbrido de rede social e plataforma de blogs. Dados da empresa de pesquisa de mercado comScore, reforçam essa ideia: eles revelam que quatro em cada dez pessoas que acessaram os dois serviços em janeiro tinham entre 15 e 24 anos de idade (no Facebook a participação dessa faixa etária cai para 27%). É o que costuma acontecer: o público jovem experimenta os produtos mais novos e aponta tendências. É também um indício da migração.
"Tenho dois novos vícios: postar imagens no Instagram e conversar com familiares, amigos do cursinho e do colégio no WhatsApp." Julia Baldini, de 18 anos, estudante
Outro indício vem da experiência relatada pelo empreendedor americano Adam Ludwin, um dos investidores do Vine, aplicativo de vídeo do Twitter. Recentemente, ele lançou o Albumatic, serviço social em formato de álbum. Antes de divulgar o produto ao público em geral, ele convidou vinte pessoas para testar a ferramenta. Todas tinham menos de 20 anos. A grande maioria rejeitou o serviço porque ele oferece autenticação a partir do cadastro no Facebook. "Aqueles jovens explicaram que não queriam compartilhar a informação do acesso ao novo produto com seus contatos do Facebook. Tive de criar uma opção tradicional de login e senha", diz Ludwin ao site de VEJA. O que os "testadores" não queriam avisar ao mundo é que havia um novo serviço na praça. É, em resumo, o contrário da missão à qual o Facebook se propõe: contar a todos o que cada um está fazendo. "Ser diferente dos outros é uma necessidade comum e antiga do jovem. Ao perceber que todos estão no Facebook, ele busca por novos espaços digitais", diz Raquel Recuero, professora e pesquisadora de redes sociais da Universidade Católica de Pelotas.
Usuários dão ainda outras explicações. "O excesso de propaganda e a lentidão do aplicativo para smartphone (que usa o sistema operacional Android) prejudicam minha relação com a rede", diz a estudante Julia Baldini, de 18 anos. A mobilidade tem sido de fato um desafio para o Facebook. Há pouco mais de um ano, percebeu-se que os usuários migravam rapidamente para smartphones, e a empresa parece ter demorado um pouco para preparar seus aplicativos para o uso constante nos aparelhinhos (a receita com publicidade da empresa chegou até a desacelerar). Mark Zuckerberg, criador e CEO do Facebook, colocou então a mobilidade como prioridade da plataforma. Prova disso é que o novo feed de notícias da rede, apresentado ao mundo nesta quinta-feira, foi desenvolvido a partir de características dos celulares, como a dimensão exígua da tela — o que resultou num visual mais enxuto.
Nesse ínterim, usuários insatisfeitos como Julia seguiram o caminho de seus pares: dirigiram suas atenções para Instagram e WhatsApp, ferramenta de mensagens instantâneas com mais de 100 milhões de cadastrados que permite envio de textos, fotos e vídeos. "Quero dividir minha vida com um círculo menor de pessoas", diz Julia. Nathalia Petreche, também estudante de 18 anos, segue o fluxo. "Tenho meu perfil no Facebook há quatro anos, mas uso o WhatsApp principalmente para conversar com grupos restritos de amigos e família. É mais prático."
O movimento, é claro, não acontece sem conhecimento do Facebook. Em dezembro, a empresa lançou o Poke, aplicativo que parece extraído de um desenho animado. Entre outros recursos, ele permite que o remetente determine o prazo de validade das mensagens que envia: instantes depois de acessada pelo destinatário, o texto se esvai. O serviço é uma reprodução fiel do Snapchat, que faz muito sucesso no exterior: estima-se que mais de 60 milhões de mensagens são enviadas diariamente por meio dele. Outro indicador de que o Facebook está de olho na migração é que, recentemente, a rede social tentou arrematar o WhatsApp. Sem sucesso, por ora.
"Nas primeiras semanas depois de excluir meu perfil no Facebook, percebi o quão alto era meu nível de dependência da rede. Aos poucos, senti que, sem a conta, nada mudou na minha vida." Guilherme Valadares, de 28 anos, empresário
Entre o público de não jovens, a migração não é a principal aposta quando se buscam razões para o afastasmento do Facebook. Pesquisa recente do Pew Research Center revelou que 61% dos adultos americanos têm voluntariamente "dado um tempo" na rede por sete dias ou mais. Eles alegam que o uso contínuo do serviço provoca ou intensifica a ansiedade, os expõe a quantidades excessivas de informação e abre brechas para problemas relativos à privacidade. "São muitos convites para jogos, eventos e correntes. Tive até desentendimentos com amigos e familiares", diz o analista de suporte técnico porto-riquenho Enrique Vélez, de 33 anos. Para outro queixoso, o auxiliar administrativo Geovane Matos, de 27 anos, o problema é mesmo a superexposição. "A rede se tornou uma praça pública digital de exibição." Seguindo exemplo de usuários mais jovens, ele migrou, mas para Google+. O empresário Guilherme Valladares, de 28 anos, tomou a decisão radical: excluiu seu perfil da rede. "Eu perdia muito tempo acessando meu feed de notícias. Aos poucos percebi que não tinha razão alguma para fazer aquilo. O Facebook havia se tornado uma fonte de ansiedade. Apenas isso", diz.
Crises de ansiedade à parte, o analista de tecnologia americano Eric Jackson defende uma tese para explicar o momento por que passa o Facebook. "A rede nem completou dez anos de vida, mas já está velha", diz, em entrevista ao site de VEJA. É uma ideia inusitada, para dizer o mínimo. Na rede de 1 bilhão de amigos, diariamente são publicadas 350 milhões de imagens e 2 bilhões de posts — e também são realizadas 3,2 bilhões de "curtidas". Os brasileiros, por exemplo, investem no serviço um de cada quatro minutos gastos na internet. Pesa a favor da ideia de Jackson, contudo, a constatação de que, nos meios digitais, gostos e tecnologias mudam de forma muito rápida. Foi assim, por exemplo, que o próprio Facebook destronou o MySpace, que já reinou entre as redes sociais. "O grupo de usuários predominante no Facebook atualmente, aqueles com mais de 25 anos, não dita mais tendências. É hora de a empresa tirar lições do uso que os jovens fazem do Instagram, comprado pelo Facebook no ano passado por 1 bilhão de dólares."
(Com reportagem de James Della Valle)
Momentos decisivos da história do Facebook
A origem: comparar garotas da universidade (2003)
Em outubro de 2003, quatro estudantes (Mark Zuckerberg, Dustin Moskovitz, Chris Hughes e o brasileiro Eduardo Saverin) da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, desenvolvem uma rede dedicada à quase pueril tarefa de comparar garotas da faculdade, escolhendo as mais atraentes. O Facemash é um sucesso: em quatro horas, atrai 450 visitas e exibe fotos das estudantes 22.000 vezes. A empreitada incentiva Zuckerberg a criar o Thefacebook.com.
Começam as batalhas jurídicas (2004)
Em fevereiro de 2004, Zuckerberg e seus amigos decidem lançar o Thefacebook.com, rede social dedicada aos alunos de Harvard. A ideia, que permite a criação de laços digitais entre estudantes, agrada: em 24 horas, mais de mil usuários se cadastram. Seis dias após o lançamento do serviço, aparecem os primeiros problemas. Três estudantes da instituição – Divya Narenda e os irmãos Cameron e Tyler Winklevoss – acusam Zuckerberg de violar regras de propriedade intelectual (a batalha judicial só seria finalizada em 2008, quando Narenda e os Winklevoss receberiam 20 milhões de dólares em ações do Facebook). Ainda em 2004, a startup recebe 500.000 dólares em investimentos de Peter Thiel, cofundador do PayPal. Em dezembro do mesmo ano, a rede alcança 1 milhão de usuários.
Cofundador do Facebook, o brasileiro Eduardo Saverin atua como administrador do Facebook no início do negócio. Mas ele logo se choca com Mark Zuckerberg. Este quer mais usuários; Saverin, mais investimentos. Sem acordo, o brasileiro decide deixar a empresa, em 2005, e terminar graduação em economia em Harvard. Zuckerberg abandona o curso de ciência da computação e, incentivado por Sean Parker, cofundador do Napster (site que fornecia músicas para download gratuito e que foi tirado do ar pela Justiça americana), muda-se para a Califórnia para se dedicar ao Facebook. A pedido do próprio Parker, a empresa compra o domínio Facebook.com por 200.000 dólares e descarta definitivamente o artigo "The" de seu nome. Mais tarde, Saverin seria processado pelo Facebook por interferir nos negócios da empresa. Segundo relatos do livro Bilionários por Acaso, Zuckerberg queria diminuir a participação do brasileiro nos ganhos totais da empresa de 24% para 0,3%. Saverin abriria processo contra a rede – do qual sairia vencedor. Hoje, detém 2,5% das ações do Facebook. Ele teve ainda seu nome oficialmente reconduzido ao rol de fundadores da companhia.
O desejo de fazer parte da rede tomou conta de universitários de várias instituições americanas (até então, o acesso era restrito a Harvard, Stanford, Columbia e Yale). Em setembro de 2006, chega a hora de pular os muros acadêmicos para abraçar o mundo: o Facebook permite a adesão de qualquer usuário com mais de 13 anos de idade. O crescimento atrai investidores e interessados em comprar a rede, que recebe proposta de 750 milhões de dólares. Mark Zuckerberg diz que o Facebook vale 2 bilhões de dólares.
Em maio, Mark Zuckerberg decide inovar: manter a sua API (application programming interface, ou interface de programação de aplicações) aberta a desenvolvedores independentes. Assim, a rede social é uma das primeiras empresas de grande porte da internet a permitir que pessoas fora de seu quadro de funcionários criem aplicativos baseados no seu código de programação. A estratégia permite que o site se renove de forma permanente, à medida que mais desenvolvedores criam jogos, enquetes e outras aplicações de interação. Em outubro, a Microsoft compra participação minoritária na rede por 240 milhões de dólares, acabando com boatos de que a gigante do software compraria o site. “O Facebook não será vendido”, diz Mark Zuckerberg.
Em 2008, o Facebook vai às compras. Segundo o diário britânico Financial Times, a empresa oferece 500 milhões de dólares pelo microblog Twitter, criado em 2006. Biz Stone, um dos fundadores da rede, rejeita a oferta.
Um novo problema: a privacidade do usuário (2010)
Em maio de 2010, o Facebook anuncia que a rede social atingira a marca de 400 milhões de usuários – marca restrita a poucos gigantes da internet. Simultaneamente ao avanço do serviço, porém, crescem as críticas às constantes mudanças na política de privacidade da rede social. O site afrouxa seguidamente as regras, ampliando a exposição de dados de cadastrados à observação pública. Ao menos uma vez, isso acontece sem aviso claro aos usuários. Autoridades de proteção de dados da União Europeia consideram "inaceitáveis" as mudanças. A companhia reage, alegando que, com as mudanças, o site simplificou a vida do usuário na tarefa de decidir o que compartilhar em seu perfil.
A história da rede social vira filme (2010)
Fenômeno da web, o Facebook chega a Hollywood em dezembro de 2010. O filme A Rede Socialnarra episódios dos primórdios do serviço, incluindo as batalhas jurídicas entre Mark Zuckerberg, os irmãos Winklevoss e o brasileiro Eduardo Saverin. A obra cinematográfica ajudou a fomentar ainda mais interesse na rede. Em 2011, o filme concorreria em oito categorias do Oscar, entre elas a de melhor filme: sairia com as estatuetas de trilha musical, edição e roteiro adaptado.
No Brasil, a luta contra o rival Orkut (2011)
No Brasil, a rede encontra resistência para destronar um gigante considerado até insuperável, o Orkut. Oficialmente, o Facebook assume a posição de rede social mais popular no país em dezembro de 2011. No mundo, sua supremacia já é incontestável: serviços populares ou locais, como oMySpace, minguam e dão espaço ao projeto de Mark Zuckerberg.
Mark Zuckerberg curte e compra o Instagram (2012)
Em abril de 2012, o Facebook abre os cofres e paga 1 bilhão de dólares pelo Instagram, aplicativo de edição e compartilhamento de fotos para plataformas móveis. Fica claro que a estratégia pretende animar investidores, de olho na esperada abertura de capital da companhia.
Em maio, a companha estreia no mercado financeiro com a maior oferta pública de ações (IPO, na sigla em inglês) da Nasdaq, a bolsa de valores do setor de tecnologia. São oferecidas 421 milhões de ações, com valor individual fixado em 38 dólares. A operação arrecada cerca de 16 bilhões de dólares: dessa forma, o valor de mercado da empresa chega a 104 bilhões de dólares. Trata-se de um marco do setor de tecnologia e o terceiro maior IPO dos Estados Unidos, atrás apenas dos realizados pela Visa, que arrecadou 19,7 bilhões de dólares, em 2008, e da General Motors, com 18,1 bilhões, em 2010.
Dias após o IPO, o escritório de advocacia americano Robbins Geller procura a Justiça acusando o Facebook de omitir a informação que o crescimento da rede registrava desaceleração, fruto da ascensão do uso de smartphones e tablets pelos usuários. O problema é que esses dispositivos não exibiam anúncios – fonte de receita da empresa. A notícia causa desconforto entre investidores. O Facebook tenta corrigir o problema, apresentando novos modelos de anúncios para tablets e smartphones. Apesar do esforço, a empresa não para de sangrar. as ações da companhia na bolsa perdem mais da metade do valor em poucas semanas e chegam a 17,55 dólares, no início de setembro, ante os 38 dólares iniciais.
Quatro meses após a estreia do Facebook na bolsa, enfim, Mark Zuckerberg vai a público explicar a situação da empresa. Em setembro, o CEO é entrevistado durante o evento de tecnologia TechCrunch Disrupt, em São Francisco, na Califórnia. Ele admite estar decepcionado com a queda do valor das ações da companhia na bolsa de valores. Na tentativa de animar usuários – e investidores –, volta a afirmar que o negócio da companhia é a mobilidade. "Decepcionamos na Nasdaq, mas vamos fazer mais dinheiro a partir de acessos via celular", promete, acrescentando que todos os esforços da empresa estão voltados ao segmento de buscas. Apesar de não apresentar nenhuma novidade, a aparição agrada o mercado – as ações da empresa sobem 4,6%.
Em outubro, o Facebook anuncia seu segundo resultado trimestral desde que a empresa abriu capital na bolsa de valores, em maio. A companhia registra prejuízo de 59 milhões de dólares entre os meses de julho e setembro deste ano, frente a um lucro de 227 milhões de dólares no mesmo período de 2011. Mesmo assim, a rede e seus investidores têm motivos para se animar: o nicho a ser atingido para superar a situação – o mundo móvel – começou a ser explorado com resultados positivos: começam a aparecer os primeiros resultados de receitas da rede provenientes de anúncios em dispositivos móveis. A informação agradou o mercado: e a bolsa reagiu bem. Um dia após o resultado, as ações da empresa disparam e encerraram o dia com o maior ganho diário, cotadas a 24,25 dólares.
Em novembro, a rede social promove sutis reformulações em sua política de privacidade e termos de uso ao validar o cruzamento de dados entre todos os produtos que foram e serão adquiridos pela empresa, como por exemplo o serviço de personalização de fotos Instagram. Ademais, a companhia eliminou quatro de seis itens presentes no artigo 14 da declaração de direitos de responsabilidade (DDR), excluindo a possibilidade de os usuários votarem nas alterações a serem feitas nas políticas e termos de uso do site.
Em janeiro, o Facebook disponibiliza seu novo sistema de buscas, o Graph Search, que em português ganhou o nome de Busca Social. O formato apresenta uma nova maneira de explorar conteúdos compartilhados na rede social, o que permite, segundo a empresa, maior relevância na procura por informações. Na prática, a busca social tem como foco o comportamento humano, a maneira como usuário interage com seus amigos.
Novo feed de notícias (2013)
No mês de março, a companhia revela alterações em seu feed de notícias – área reservada às atualizações de toda a rede de contatos do usuário. A mudança permite que os usuários utilize novos filtros para decidir o que vai aparecer em sua página, como categorias específicas para posts sobre músicas, vídeos, games e fotos.
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